LGPD para contadores

A contabilidade, certamente está entre os ramos mais expostos às variáveis impostas pela nova Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD. Isso porque, estão entre aquelas categorias que, além de armazenarem dados dos seus clientes, certamente processam também dados dos clientes dos seus clientes. É inerente à atividade de contabilista, ou como eram antigamente chamados, os guarda livros, o processamento e armazenagem de dados. Seja em meio físico ou virtual.  

Embora a própria redação da LGPD remeta principalmente à segurança de dados armazenados em meio digital, esta é apenas uma das modalidades de tratamento previstas, é inegável que a atividade de contabilidade está entre aquelas que realiza o maior número de operações de tratamento em meio físico, aumentando em muito as variáveis com relação à segurança de dados pessoais.

Dados Contábeis São um Alvo Natural

Quando se fala em proteção de dados, o objetivo principal é evitar a exposição e consequente uso indevido dos dados em atividades criminosas, como por exemplo fraudes bancárias, estelionato, roubo, extorsão entre tantos outros, tudo fazendo uso de dados individuais desprotegidos. E como dito anteriormente os escritórios de contabilidade armazenam além dos dados dos seus clientes, via de regra os dados dos clientes dos clientes, o que os torna um alvo atrativo para a ação de criminosos.

Isso por que os dados contábeis consistem em informações pessoais valiosas, certificadas e ligadas diretamente ao trânsito de valores dos usuários ou a estes relacionado. Assim, o sistema de adequação ou conformidade à proteção de dados do escritório contábil necessariamente fará parte do sistema de adequação ou conformidade de cada um dos seus clientes, visto que passam a ser uma variável de segurança para cada um deles, uma vez que mantém dados dos clientes fora do seu ambiente seguro, seja ele físico ou virtual.

Dessa forma, sempre que alguém mal intencionado pretender atacar dados de determinada empresa ou pessoa, terá no respectivo escritório contábil uma grande variável com boas chances de êxito, caso a governança dos dados não seja eficaz.

Além disso, dois outros pontos são de grande relevância para o ambiente contábil: O primeiro já assinalado, diz respeito ao grande número de dados com suporte em meio físico, por mais que a contabilidade invista em tecnologia, será sempre uma variável, já que documentos com suporte físico ainda são a maioria. E em segundo lugar, o material humano, uma vez que a operação contábil, mesmo para um escritório de porte médio ou pequeno, demanda certa quantidade de funcionários, tendo em vista o grande volume de atividades de processamento. Isso mesmo que o investimento em tecnologia seja um dos pilares da empresa.

Os Prejuízos Decorrentes da Governança Ineficaz

Todo o escritório contábil assim como qualquer pessoa submetida à Lei 13.709/18, poderá sofrer as sanções previstas em virtude de danos resultantes de violação à legislação de proteção de dados pessoais. Entre as sanções previstas estão (Art. 52 da LGPD):

  • aplicação de multa de até 2% (dois por cento) do faturamento, limitada a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) por infração;
  • aplicação de multa diária;
  • tornar pública a infração;
  • bloqueio dos dados até a regularização;
  • eliminação dos dados relativos à infração;
  • suspensão do banco de dados a que se refere a infração por até seis meses, sendo possível a prorrogação;
  • suspensão da atividade de tratamento de dados;
  • proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados

Do ponto de vista de qualquer empresário as sanções já parecerão severas, mas sob a ótica do contabilista o quadro pode se tornar extremo, inviabilizando no mais das vezes, a própria continuidade do negócio.

Superando a obviedade do prejuízo decorrente da aplicação de multas, as sanções que interferem diretamente na operação do negócio resultarão certamente um prejuízo maior para os escritórios de contabilidade, isso porque a interrupção da atividade de tratamento destas empresas na maioria das vezes implicará igualmente a interrupção das atividades também de seus clientes. A consequência lógica será um esvaziamento da carteira e inevitável encerramento das atividades.

Não fosse isso o bastante, o repúdio da clientela poderá vir também em virtude da publicização da infração, fazendo com que o escritório caia em descrédito. Afinal, como o cliente se sentirá confortável em saber através de uma noticia publicada no site oficial, que o seu escritório de contabilidade não é capaz de garantir a segurança dos seus dados.

Por fim, mas não menos importante vislumbra-se a possibilidade de regressão dos clientes contra o escritório na esfera judicial, uma vez que determinada a interrupção do tratamento de dados pela contabilidade, as atividades dos clientes certamente serão prejudicadas. Ou seja, o cliente que perceber qualquer prejuízo decorrente da ingerência do seu escritório de contabilidade, além de certamente procurar um novo escritório, demandará judicialmente contra o antigo a fim de ter o seu prejuízo ressarcido.

Trata-se de uma grande oportunidade!

Seguindo a análise, tão logo os caminhos sejam mapeados, haverá uma crescente de demandas judiciais envolvendo pedidos de indenizações com base na LGPD. Especialmente contra os escritórios contábeis. Vejamos por exemplo um escritório que é responsável mensalmente por roda a folha de pagamento de seus clientes. E que um dos funcionários de um dos clientes, ao deixar o emprego resolva demandar contra seu empregador, mas também a esfera cível, contra o escritório contábil requerendo a demonstração da segurança aplicada na guarda de seus dados pessoais, a anonimização e ainda o descarte dos dados, tendo em vista a sua retirada da empresa.

Àqueles que mantiverem a regularidade com relação as normas da LGPD, bastara a disponibilização das informações e o descarte dos dados, de acordo com a política estabelecida. Aos demais será preciso muito esforço e criatividade para prestar esclarecimentos sobre os motivos que levaram ao não cumprimento da norma estabelecida.

E onde está a oportunidade?

A oportunidade se apresenta para aqueles que de fato cumprirem a norma e mantiverem ativa a conformidade com a LGPD. Não é necessário ser especialista para saber que muitos empresários, inclusive do ramo contábil, estão negligenciando a necessidade de adequação, apostando na inércia da autoridade fiscalizadora. Ledo engano, a fiscalização ocorrerá muito mais pelas mãos dos usuários através de demandas judiciais.

De outro lado estarão os empresários diligentes, e que cuidaram de estabelecer um programa de adequação nos moldes da legislação. A estes bastará ampliar a infraestrutura e caprichar no café para receber os clientes desassistidos, que contratarão em caráter de urgência o novo escritório a fim de não perceber prejuízos ainda maiores. Certamente o plano de conformidade deverá estar disponível na mesa de negociações.

Trata-se de uma visão, não futuro, mas do iminente presente. As cartas estão postas e o blind é elevado: o seu negócio!

Rodrigo Martins Elias, Gerente de Operações Jurídicas – FLN